Entrevista:
Marina Grossi
Atuante há 20 anos na área de mudança do clima e de finanças sustentáveis, Marina Grossi está no CEBDS desde 2005 e é presidente da instituição desde 2010. Na entrevista a seguir, ela discute a evolução do debate sobre sustentabilidade no Brasil, os desafios que se apresentam para o futuro e o papel do Conselho nessas transformações.
Em 2017, o CEBDS completa 20 anos de atuação. Pode relembrar um pouco das intenções que nortearam a criação do Conselho, em 1997, e como era o debate a respeito da sustentabilidade no Brasil, na época?
O ponto de partida das discussões foi a Rio-92. Ali, as lideranças empresariais começaram a demonstrar interesse pelo tema, o que culminou na criação do World Business Council for Sustainable Development (WBCSD), rede global da qual o CEBDS faria parte, cinco anos mais tarde, quando foi estabelecido no Brasil. A ideia sempre foi a de criar uma plataforma empresarial para a sustentabilidade. A opção por convocar grandes empresas não foi ocasional: era importante que o debate contasse com os recursos e com a disciplina de gestão que essas empresas poderiam agregar.
Quais foram as mudanças mais significativas ocorridas nessas duas décadas no panorama da sustentabilidade empresarial no Brasil?
A gestão da sustentabilidade passou a ser vista como fator competitivo. Na verdade, nestes 20 anos, a questão se tornou imperativa. O país e o mundo tornaram-se mais complexos. Antes, a preocupação com o social e com o ambiental era tratada de forma segmentada.
E como vê o estágio atual de maturidade das empresas sobre o desenvolvimento sustentável?
Dentro das empresas há um engajamento maior: mais setores e departamentos estão envolvidos nos debates e a comunicação interna é mais efetiva. Hoje a colaboração é maior, não só entre o governo e a iniciativa privada e diversas instâncias da sociedade, mas também entre as empresas, até mesmo entre competidores. À medida em que foram se acumulando evidências científicas sobre as mudanças do clima, impactos sociais e outros temas, as empresas passaram a internalizar essas questões e mensurá-las. Mas ainda temos desafios. O engajamento efetivo dos CEOs, por exemplo, precisa avançar.
Pode apontar os marcos recentes do debate global sobre sustentabilidade que mais impactaram o CEBDS?
Destacaria o Acordo de Paris e os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS). A partir do Acordo de Paris nenhuma empresa e nenhum país pôde mais alegar desconhecimento a respeito dos efeitos adversos das mudanças do clima. Com o lançamento dos ODS e o estabelecimento da Agenda 2030, criou-se um ambiente global para um novo tipo de desenvolvimento com iniciativas voltadas para responder aos desafios sociais e ambientais, com cidades, empresas e governos colaborando mais entre si.
Qual será o papel do CEBDS daqui para a frente, considerando as mudanças sociais, ambientais e econômicas que já estão ocorrendo?
O Visão Brasil 2050 do CEBDS mapeou as principais transformações que devem ocorrer nos próximos anos para termos um país justo, inclusivo, utilizando nossa riqueza ambiental para garantir mais prosperidade para todos. O Ação 2020 sintetizou um conjunto de recomendações concretas para que as empresas contribuam para a construção de um país mais sustentável. Ambos foram construídos com o envolvimento de muitas pessoas e já se tornaram referências para as empresas e para o governo.
Comente sobre os avanços mais importantes que o CEBDS fez rumo ao cumprimento de sua missão: “conduzir a transformação prática de setores, mercados, empresas e profissionais, aliando os negócios e a sociedade para um país sustentável”.
Nos últimos anos, intensificamos o diálogo com as lideranças das empresas, os CEOs, e assumimos uma presença ainda mais estratégica no compartilhamento de conhecimento e na promoção de ações colaborativas entre as nossas empresas, além da atuação com o governo e com a sociedade, uma parceria que faz bem a todos. Ampliamos nosso contato com o governo, que foi estendido para áreas além do campo ambiental – como o Ministério da Fazenda, por exemplo. A essência de nossa missão é apresentar soluções de negócios que realmente causem impacto positivo. Temos orgulho de termos conseguido ajudar na estruturação de parcerias realmente efetivas e na criação de um ambiente de confiança entre as empresas, além das parcerias feitas com as demais representações do setor empresarial, ONGs e do governo. Isso permitiu sermos mais eficazes e causar maior impacto na sociedade.
Entrevista:
Marcos Bicudo
Chair do CEBDS desde 2008, Marcos Bicudo já desempenhou funções de liderança em alguns dos maiores grupos empresariais do país e destacou-se particularmente no planejamento do projeto Rio Cidade Sustentável, durante a Rio +20, em 2012. Na entrevista a seguir, discute o papel do empresariado diante dos desafios na busca pelo desenvolvimento sustentável.
Como você analisa a evolução da agenda do desenvolvimento sustentável no Brasil nos últimos 20 anos?
Houve um avanço importante nestes últimos 20 anos, no qual o CEBDS desempenhou um papel central na evolução através de seus associados – articulando os atores da sociedade e ancorado na global network do WBCSD, o que possibilitou um respaldo de conteúdo imprescindível. Apesar dos avanços, o senso de urgência que o tema demanda e a oportunidade de estabelecer uma vantagem competitiva para o nosso país no plano internacional precisa ser acelerado. E isso ganha força com a agenda global instituída em 2015, que estabelece os 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável para empresas, governo e sociedade. Esse é o nosso novo desafio.
Como a história do CEBDS se mistura com a própria história do desenvolvimento sustentável no país?
O CEBDS tem sido um grande catalisador desse avanço principalmente dentro do setor privado, onde está seu círculo direto de influência. Só para citar alguns exemplos: a edição do primeiro Relatório de Sustentabilidade Empresarial do Brasil em 1997; a criação da Rede Brasileira de Produção Mais Limpa junto ao Sebrae em 1999; e a implementação, em parceria com o World Resources Institute (WRI) e a Fundação Getulio Vargas, da principal ferramenta de medição de emissões de gases de efeito estufa no país, o GHG Protocol, em 2008.
Podemos dizer que o CEBDS também busca influenciar os rumos da história com seu olhar para o futuro. Dois exemplos disso são o relatório Visão Brasil 2050, de 2012, e a publicação Ação 2020, lançada em 2014. Em síntese, o primeiro projeta o mundo em que queremos viver na metade deste século, enquanto o segundo sintetiza um conjunto de recomendações concretas e viáveis, a serem implementadas no curto prazo pelo setor empresarial.
É possível afirmar que o setor empresarial hoje apresenta um posicionamento diante do tema da sustentabilidade diferente do de 20 anos atrás? Como se deu essa trajetória?
Pode-se dizer que o CEBDS foi um dos principais responsáveis por engajar o setor empresarial ao tema do desenvolvimento sustentável, que até então apresentava um posicionamento mais reativo ao trabalhar essa agenda. Hoje, é possível observar uma mudança de postura das empresas, que assumiram um papel de protagonismo na agenda.
Quais são os desafios que o setor empresarial enfrenta atualmente e como o mesmo pode acelerar o alcance de uma economia de baixo carbono no Brasil?
Os mercados são os melhores ambientes para promover mudanças e as lideranças empresariais representam a alavanca e o agente principal de mudança. Claro que o governo tem papel muito importante para promover a transformação necessária, criando marco regulatório, incentivos e políticas públicas compatíveis e estimulantes. Porém, a iniciativa privada deve liderar essa transformação através da inovação, da sua capacidade de investimento e principalmente através da eficiência na execução e na adoção de padrões produtivos sistêmicos e circulares.